O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) conseguiu o oposto do que almejava com sua escalada autoritária: uniu, contra ele, Supremo, Senado, governadores, subprocuradores, partidos políticos e ex-presidentes da República. A defesa da democracia é soberana. Os últimos dias foram ilustrativos desse rebote. Na sexta (20), o presidente pediu o impeachment do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, depois de promover ataques a ele e ao presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Luis Roberto Barroso. Recebeu de volta o repúdio em diversas instâncias.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), declarou que não deve levar o pedido adiante. Nessa tentativa de acertar Moraes, Bolsonaro acabou complicando a sabatina de André Mendonça, Advogado-Geral da União, candidato a uma cadeira no Supremo e que precisa ser aprovado pelo Senado. No sábado (21), dez ex-ministros da Justiça e da Defesa assinaram um manifesto em defesa da democracia como resposta aos ataques de Bolsonaro aos ministros do Supremo. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) expressou “preocupação” com o pedido de impeachment de Moraes e se posicionou a favor dos preceitos da Constituição e da convivência próxima e cooperativa entre os Poderes.
No domingo (22), MDB, DEM, PSDB, PT, Rede, PCdoB, PSB, PV, Cidadania e PDT se posicionaram contra a instabilidade política provocada por Bolsonaro e em amparo às instituições e aos Poderes. Os ataques do presidente à democracia e as ameaças de não aceitar os resultados da eleição de 2022 sem o voto impresso uniram cinco ex-presidentes da República, que procuraram militares para sondar o clima nos quartéis. Os generais afastaram a hipótese de insubordinação. Michel Temer, Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva, José Sarney e Fernando Collor fizeram parte do contato, segundo o Estadão.
A maionese desandou também contra o Procurador-Geral da República, Augusto Aras, e o vice-procurador, Humberto Jaques. Cinco subprocuradores da República entraram com um mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal para que a corte determine a imediata distribuição da notícia-crime contra Aras e Jaques por prevaricação, como informou Malu Gaspar, em O Globo. O PGR tem sido compreensivo demais com a omissão e o autoritarismo de Bolsonaro.
Nesta segunda (23), 24 governadores se reunirem para conter a tensão instada por Bolsonaro. “Nossa atitude agora deve ser de serenidade porém de firmeza”, disse o governador do Maranhão, Flávio Dino (PSB), em entrevista ao UOL News. Ele defende o impeachment de Bolsonaro e afirmou que o vice-presidente, Hamilton Mourão, poderia atuar “como uma saída de transição”. Aos olhos dos eleitores, os governadores têm muito mais aprovação que o presidente da República. Na pesquisa XP/Ipespe divulgada na semana passada, 54% disseram que o governo Bolsonaro é “ruim/péssimo”. No caso dos governadores, esse índice cai para 26%.
Com essas mensagens, Bolsonaro tem apelado para a sua base mais radical, que se mantém fiel e resiliente, na marca dos 23-25%. Aposta tudo em incitar a participação nas manifestações marcadas para 7 de setembro, em São Paulo e em Brasília. O que mais preocupa quem defende a democracia é que bolsonaristas radicais estão mais armados desde o começo do governo e alguns atuam dentro das polícias militares, como é o caso do coronel Aleksander Lacerda, da PM de São Paulo. Ele foi afastado pelo governador João Doria (PSDB) por indisciplina ao convocar para os atos. Não é de hoje que parte dos policiais responde mais a Bolsonaro que aos governadores.
O receio é pertinente. Um levantamento do Instituto IDEIA, de julho, publicado nesta coluna com exclusividade, mostrou que PMs do Ceará, São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco e Rio Grande do Sul mudaram de opinião sobre a urna eletrônica desde o começo do mandato de Bolsonaro: 55% dos entrevistados disseram não confiar na urna eletrônica. Em 2018, eram 25%. Bolsonaro foi acometido pelo princípio da ação e reação. Se continuar assim, dois cenários se apresentam: ou os protestos de 7 de setembro estarão vazios e marcarão mais um vexame como o desfile de tanques sucateados; ou a manifestação seguinte, convocada pelo MBL contra Bolsonaro para 12 de setembro, terá muito mais adesão que os atos bolsonaristas. A democracia é um bem maior.
Fonte: noticias.uol.com.br